Há mais de 75 anos, surgia o Batman, um super-herói essencialmente sombrio. O personagem abandona as suas raízes sombrias, massacrado pela censura do Comics Code Authority, durante a década de cinquenta. Seria então na década de setenta, quando este "Código dos Quadrinhos" já vinha perdido muito de sua força, que as grandes editoras não mais se submeteriam a ele, e o Batman finalmente poderia retornar às suas raízes sombrias. E foi em fevereiro de 1986, que a DC Comics lançou Batman O Cavaleiro das Trevas de Frank Miller, e Batman e as histórias em quadrinhos nunca mais seriam os mesmos.
Acredite ou não, naquela época, Batman não era tão popular como é hoje. Após a Batmania dos anos sessenta, o interesse pelo Cruzado Mascarado diminuiu. Até o início dos anos setenta, os quadrinhos estavam à beira do cancelamento. Denny O'Neil e Neal Adams foram os principais responsáveis por reacender os quadrinhos, tornando-os mais góticos (enquanto na televisão, os "Superamigos" mantinham um Cavaleiro das Trevas amigável).
Vá ao Google. Digite Frank Miller. Ele agarrou o Batman pelo capuz, e junto de outros grandes nomes da época, inaugurou a Era das Trevas dos Quadrinhos. A imagem do super-herói de roupa colorida foi se distanciando do imaginário popular. Os super-heróis estavam se tornando as almas torturadas que conhecemos e amamos hoje.
Frank Miller |
The Dark Knigth Returns Batman O Cavaleiro das Trevas |
O Batman de Frank Miller foi uma enorme influência sobre os filmes de Chris Nolan, e houve a recente tentativa de reproduzi-lo em Batman vs Superman. É evidente como uma história em quadrinhos escrita há 30 decidiu o futuro de um personagem como o Batman.
Um dos melhores personagens dos quadrinhos, com grandes historias e personagens marcantes e profundos. Faço questão de deixar claro que eu sou um grande fã do Batman e do Frank Miller.
Após trabalhar na Western Publishing, Miller realizou pequenos projetos com a DC Comics, até que em 1979 foi contratado pela Marvel Comics.
Matt Murdock, o Demolidor, não era um super-herói tão reconhecido antes de Frank Miller trabalhar com o personagem na Marvel. Quando o autor tomou conta do seu título, trouxe uma nova perspectiva para o personagem, acrescentando grandes elementos a sua mitologia, tornando-a muito mais interessante e empolgante, além de novos personagens como Elektra, a sua mais famosa.
Os anos oitenta foram o seu período mais brilhante. Daquela época, podemos citar a minissérie do Wolverine, situada no Japão, que ele escreveu e co-roteirizou, e ainda escreveu Ronin, com clara influência de "O Lobo Solitário" do mangaká Kazuo Koike. Este trabalho de Miller foi um sucesso de crítica e também o responsável por popularizar os mangás japoneses no ocidente.
Após trabalhar na Western Publishing, Miller realizou pequenos projetos com a DC Comics, até que em 1979 foi contratado pela Marvel Comics.
Demolidor (Daredevil) HQ: inspiração para séries modernas. |
Wolverine |
Ronin |
Batman Ano Um |
Todos estes títulos seriam apenas um aquecimento para o que ainda estava por vir, com Batman O Cavaleiro das Trevas, Batman Ano Um e, com o seu retorno à Marvel, A Queda de Murdock.
Daredevil - Born Again |
Daredevil - Born Again |
Batman O Cavaleiro das Trevas é considerada por muitos a melhor história já escrita para o personagem. E de fato já se foram 30 anos e ainda estamos falando sobre ela!
Fora da Marvel e da DC, Miller ainda foi o responsável por grandes sucessos como Hard Boiled, Martha Washington, 300 e Sin City.
300 |
Sin City |
Em Batman Ano Um, além do novo tom mais sombrio, Miller acrescentou vários aspectos à mitologia do personagem. Nesta nova versão, é o seu mordomo Alfred quem passa a cuidar do jovem Bruce Wayne, tornando-se o seu tutor, após o assassinato dos seus pais.
E os pais de Bruce Wayne, aliás, agora foram assassinados diante do pequeno Bruce após saírem de um cinema. E ainda Bruce encontrou a inspiração do morcego, que surgiu voando em sua janela. Antes disso, o que inspirou Bruce foi a sua queda, ainda criança, em um buraco dos jardins de sua casa, onde ele se assustou com um ataque de centenas de morcegos. Independente das versões, estas foram as inspirações para Bruce Wayne vestir-se como um morcego e trazer o terror para todos os criminosos de Gotham.
Ele jurou nunca matar, e enfrentar os seus inimigos valendo-se apenas de suas habilidades marciais e de sua inteligência. Em 1939 nas páginas da Detective Comics, um ano após o surgimento do Superman, os autores Bill Finger e Bob Kane apresentaram um personagem que seria o verdadeiro contraponto do Homem de Aço, um super-detetive que confronta o crime usando a sua mente antes dos seus punhos.
Batman O Cavaleiro das Trevas nos apresenta um Batman aposentado que, devido a decadência da sociedade que o cerca e o aumento da criminalidade, não tem outra escolha a não ser voltar a ativa. A princípio teme não ser mais digno do manto do morcego, mas ele está de volta a ação, embora já mostrando os primeiros sinais de fraqueza.
Como dito antes, não foi Miller quem permitiu ao Batman ser um personagem sombrio novamente, como nos seus primeiros anos. Após a Era de Prata e Adam West, há 16 anos de histórias sombrias e moralmente complexas do Batman.
O Cavaleiro das Trevas não foi tão impactante porque fez o Batman sombrio novamente, mas foi impactante porque abalou os restos do Comics Code Authority que influenciaram a forma como os autores escolheram para contar suas histórias desde 1954. Livre desse fardo, Miller foi autorizado a respeitar o material de origem, ignorando as cadeias de continuidade. Nossos ícones poderiam falhar, poderiam sangrar, poderiam ser desconstruídos.
1986, as cidades estavam completamente tomadas pelo crime e pela violência, era a época da Guerra Fria, e do temor de uma nova guerra mundial que poderia acabar com todo o nosso planeta. O governo havia proibido super-heróis por causa de sua propensão para a destruição, e o medo que eles criaram entre os seres humanos comuns. Este foi um aspecto de nosso mundo, onde fazia sentido um Superman trabalhar secretamente para o governo dos EUA, a fim de fazer o pouco de bem que poderia, e que o Batman seria visto como uma ameaça de nível terrorista devido a sua capacidade de fazer o que as forças armadas não poderiam. Miller explorou estes dois ícones como os dois lados da América: o homem que está pela verdade, justiça e o American Way, e o homem que sabe que isto é tudo uma mentira e, portanto, é livre para considerar a possibilidade de conspiração.
O Cavaleiro das Trevas não foi tão impactante porque fez o Batman sombrio novamente, mas foi impactante porque abalou os restos do Comics Code Authority que influenciaram a forma como os autores escolheram para contar suas histórias desde 1954. Livre desse fardo, Miller foi autorizado a respeitar o material de origem, ignorando as cadeias de continuidade. Nossos ícones poderiam falhar, poderiam sangrar, poderiam ser desconstruídos.
1986, as cidades estavam completamente tomadas pelo crime e pela violência, era a época da Guerra Fria, e do temor de uma nova guerra mundial que poderia acabar com todo o nosso planeta. O governo havia proibido super-heróis por causa de sua propensão para a destruição, e o medo que eles criaram entre os seres humanos comuns. Este foi um aspecto de nosso mundo, onde fazia sentido um Superman trabalhar secretamente para o governo dos EUA, a fim de fazer o pouco de bem que poderia, e que o Batman seria visto como uma ameaça de nível terrorista devido a sua capacidade de fazer o que as forças armadas não poderiam. Miller explorou estes dois ícones como os dois lados da América: o homem que está pela verdade, justiça e o American Way, e o homem que sabe que isto é tudo uma mentira e, portanto, é livre para considerar a possibilidade de conspiração.
Miller também inovou ao fazer de uma menina Robin pela primeira vez. Podem ter ocorrido tentativas de se imitar a Robin de Carrie Kelley nestes últimos 30 anos, mas não foi nada em comparação com esta jovem adolescente que recebeu o velho traje do Menino Prodígio.
O que seria de uma história do Batman sem o Coringa? Ele aparece aqui, e da mesma forma sai de sua aposentadoria (e de um estado catatônico), quando o Batman faz o mesmo. Este conto confirma ainda que o Coringa não pode existir sem um Batman e, como o Coringa de Heath Ledger disse: "Eu acho que você e eu estamos destinados a fazer isso para sempre."
O maior acontecimento em O Cavaleiro das Trevas é o Superman sendo enviado pelo governo dos EUA para intervir com os métodos do Batman, que fazia justiça com suas próprias mãos combatendo o crime em Gotham no decorrer da história. Assim começa uma batalha entre os dois. E como muitos já devem estar cientes, o recente filme de Zack Snyder inverteu os papéis destes dois super-heróis no conto de Frank Miller.
O Cavaleiro das Trevas é tão relevante hoje como foi há 30 anos. O Batman vigilante faz todo o sentido para a sociedade. E agora, antes de escrever o que aprendi com Frank Miller, vou deixar claro um ponto de vista meu sobre as histórias do Batman.
A Piada Mortal de Alan Moore é um conto fantástico do Coringa, uma espetacular história sobre uma possível origem para o Príncipe Palhaço do Crime. O Coringa é o verdadeiro protagonista desta história.
Mas, e isso é uma opinião muito pessoal minha, prefiro o Batman vigilante que o Frank Miller apresenta em O Cavaleiro das Trevas ao Batman, digamos, "relativista" que confronta o Coringa em A Piada Mortal. E quando você percebe que os jovens admirando mas o Coringa, por suas atitudes (muitas vezes relacionadas ao estupro e assassinatos) do que o Batman, isso pode significar que há algo de errado.
Continuando. É lamentável que apenas um único aspecto do Batman tem sido explorado em quaisquer destas histórias feitas recentemente para o personagem, vide o Batman interpretado por Ben Affleck em Batman vs Superman.
Em essência, Batman é um homem que pode caminhar entre os deuses. Ele não é um deus, é apenas um homem.
Não vivo na Nova York, como Frank Miller, a cidade dominada pelo crime e pela violência que o inspirou a criar a sua obra-prima Batman O Cavaleiro das Trevas, mas provavelmente vivo num lugar muito pior, que permite a corrupção, os crimes impunes e o enriquecimento de círculos de poder que deixaram os pobres ainda mais pobres, com suas políticas fracassadas.
Muitos devem se perguntar por que diabos alguém ainda vive em Gotham. Pelo menos nós sabemos que Gotham de fato sequer existe. Mas tudo faz sentido quando fazemos uma conexão entre a cidade e o seu herói.
Em Gotham parece que é "sempre noite". Durante o dia há pouca luz. E à noite é muito mais escura até antes do amanhecer. Em um sentido profundo e real, a cada dia o mundo permanece sombrio, com sua miséria e desespero. Batman surge como um símbolo de esperança. Batman abraça a escuridão. Ele pode se vestir de preto, mas por dentro é um ser ainda mais luminoso do que o Superman ou qualquer outro.
Batman é o meu super-herói favorito não porque foi capaz de vencer deuses, mas porque tornou-se um símbolo que representa a luz na escuridão.
Batman não está esperando o reconhecimento e os aplausos de ninguém. Batman está disposto a fazer o impensável para salvar vidas. Batman não existe em carne e osso, mas existe no imaginário coletivo ao longo de gerações, inspirando criadores, escritores, engenheiros, doutores, crianças, pessoas comuns como você e eu.
O personagem deixou algo muito mais profundo do que um grande legado em histórias em quadrinhos. Os livros, os filmes, as músicas não tem mais nenhuma utilidade além de inspirar o que há de melhor em cada um de nós e fazer crescer a nossa imaginação, e Batman faz parte de todo este imaginário coletivo.
Sobre o personagem Frank Miller falou: “Existe alguma coisa humilhante sobre a primeira vez que você é derrubado no chão e leva um soco no estômago e alguém esfrega uma arma na sua cara e você se dá conta de que está a mercê de alguém. E que eles podem tirar a sua vida. Nesse momento, você faria qualquer coisa. Existe algo de humilhante nisso. Certo, o Super-Homem pode voar, mas o Batman me transforma naquele cara que tem medo e ao mesmo tempo é o cara que pode chegar e salvá-lo. É o mito perfeito. Ele é interessante porque acerta o mundo. E traz ordem para um mundo caótico. Especialmente se você é uma criança. Você precisa de alguém, mesmo que seja um personagem de ficção, para te dizer que o mundo faz sentido e que os caras bons podem ganhar”.
James Gordon, interpretado por Gary Oldman, ao final do fenomenal The Dark Knight, em poucas palavras transmite toda a essência deste super-herói:
Stan Lee e Frank Miller |
Mas, e isso é uma opinião muito pessoal minha, prefiro o Batman vigilante que o Frank Miller apresenta em O Cavaleiro das Trevas ao Batman, digamos, "relativista" que confronta o Coringa em A Piada Mortal. E quando você percebe que os jovens admirando mas o Coringa, por suas atitudes (muitas vezes relacionadas ao estupro e assassinatos) do que o Batman, isso pode significar que há algo de errado.
Continuando. É lamentável que apenas um único aspecto do Batman tem sido explorado em quaisquer destas histórias feitas recentemente para o personagem, vide o Batman interpretado por Ben Affleck em Batman vs Superman.
Em essência, Batman é um homem que pode caminhar entre os deuses. Ele não é um deus, é apenas um homem.
I belive you! |
Muitos devem se perguntar por que diabos alguém ainda vive em Gotham. Pelo menos nós sabemos que Gotham de fato sequer existe. Mas tudo faz sentido quando fazemos uma conexão entre a cidade e o seu herói.
Em Gotham parece que é "sempre noite". Durante o dia há pouca luz. E à noite é muito mais escura até antes do amanhecer. Em um sentido profundo e real, a cada dia o mundo permanece sombrio, com sua miséria e desespero. Batman surge como um símbolo de esperança. Batman abraça a escuridão. Ele pode se vestir de preto, mas por dentro é um ser ainda mais luminoso do que o Superman ou qualquer outro.
Batman é o meu super-herói favorito não porque foi capaz de vencer deuses, mas porque tornou-se um símbolo que representa a luz na escuridão.
Batman não está esperando o reconhecimento e os aplausos de ninguém. Batman está disposto a fazer o impensável para salvar vidas. Batman não existe em carne e osso, mas existe no imaginário coletivo ao longo de gerações, inspirando criadores, escritores, engenheiros, doutores, crianças, pessoas comuns como você e eu.
O personagem deixou algo muito mais profundo do que um grande legado em histórias em quadrinhos. Os livros, os filmes, as músicas não tem mais nenhuma utilidade além de inspirar o que há de melhor em cada um de nós e fazer crescer a nossa imaginação, e Batman faz parte de todo este imaginário coletivo.
Sobre o personagem Frank Miller falou: “Existe alguma coisa humilhante sobre a primeira vez que você é derrubado no chão e leva um soco no estômago e alguém esfrega uma arma na sua cara e você se dá conta de que está a mercê de alguém. E que eles podem tirar a sua vida. Nesse momento, você faria qualquer coisa. Existe algo de humilhante nisso. Certo, o Super-Homem pode voar, mas o Batman me transforma naquele cara que tem medo e ao mesmo tempo é o cara que pode chegar e salvá-lo. É o mito perfeito. Ele é interessante porque acerta o mundo. E traz ordem para um mundo caótico. Especialmente se você é uma criança. Você precisa de alguém, mesmo que seja um personagem de ficção, para te dizer que o mundo faz sentido e que os caras bons podem ganhar”.
James Gordon, interpretado por Gary Oldman, ao final do fenomenal The Dark Knight, em poucas palavras transmite toda a essência deste super-herói: