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domingo, 2 de janeiro de 2022

0S MELHORES FILMES CULTS QUE EU VI EM 2021



METROPOLIS

País: Alemanha

Ano: 1927

Já havia assistido antes? Não


Surreal, expansivo e operístico, baseando-se em imagens cristãs bíblicas e medievais, bem como A Máquina do Tempo de H.G. Wells, Metropolis, do expressionismo alemão do cineasta austríaco Fritz Lang, colonizou um novo reino da imaginação que moldou a ficção científica subsequente de Flash Gordon a Star Wars, de "Os Jetsons" a Blade Runner. As paisagens futuristas da cidade que são um marco da ficção científica, com seus arranha-céus impossivelmente maciços e veículos voadores enfiando cânions de concreto, todos devem uma dívida ao filme de Lang, um dos pontos altos do expressionismo alemão.

Como alegoria social, Metropolis retrata um mundo em que os filhos privilegiados da sociedade vivem em facilidade e luxo na superfície enquanto nas entranhas da cidade trabalhadores operam as máquinas que sustentam todo aquele mundo. Com o tempo, essa situação opressiva eventualmente leva aos conflitos de classe.

Observa-se perceptivamente nesse cenário uma semelhança impressionante com a história do futuro mundo visitado pela Máquina do Tempo de Wells, onde os Morlocks trabalhavam em máquinas subterrâneas para servir aos burgueses. No entanto, em A Máquina do Tempo, esse conflito de classes eventualmente leva ao que está em vigor a revolução marxista, com os Morlocks proletários se levantando e subjugando os burgueses. Em Metropolis, há uma visão surpreendentemente contrastante que leva o seu conflito de classes a uma resolução diametralmente oposta, baseando-se em imagens religiosas e inspiração na defesa da reconciliação não violenta entre as classes.

Na verdade, Metropolis avança a tese provocativa de que a violência revolucionária realmente serve ao interesse próprio da classe dominante, uma vez que permite que eles respondam esmagando elementos dissidentes. 

O enredo onírico, que se baseia em conexões emocionais e poéticas ao invés de lógicas, envolve um jovem herói infantil chamado Freder (Gustav Fröhlich) cujo pai ditatorial (Alfred Abel) é o mestre de Metropolis, uma jovem idealista chamada Maria (Brigitte Helm) que tenta oferecer esperança aos trabalhadores oprimidos, e um cientista sinistro chamado Rotwang (Rudolf Klein-Rogge) a quem o pai de Freder se alia para subverter os esforços de Maria construindo um "clone" robótico da mesma.

Mais importantes do que a história são as imagens inesquecíveis: as intermináveis colunas de trabalhadores marchando em sincronia noturna e de seu terrível trabalho; a monstruosa Máquina "M", revelada em um momento visionário para incorporar o espírito de Moloch, a divindade sanguinária do Canaã do Antigo Testamento; Freder agonizantemente trabalhando na máquina relógio parecendo Cristo crucificado; o striptease lascivo do robô-Maria seduzindo os pais privilegiados de Metropolis para os Sete Pecados Capitais; a imensa catedral gótica em que o confronto final ocorre.

Alusões religiosas estão por toda parte. Maria e sua "clone" malvada sugerem respectivamente a Virgem Maria e a Prostituta da Babilônia. Freder, o filho, é um agente de reconciliação semelhante a Cristo, enquanto o pai Joh é um deus autointitulado tomando o lugar do próprio Deus seu próprio mundo, até desencadeando uma inundação para destruir seu povo quando eles o desagradaram. Os escritórios de Joh estão em um arranha-céus chamado Nova Torre de Babel, e o conflito climático está repleto de referências ao Apocalipse.

Osamu Tezuka, considerado "O Deus do mangá", falava abertamente que as suas maiores inspirações para a arte estavam em Walt Disney e no expressionismo alemão. Inclusive está entre as obras que Tezuka deixou a sua própria versão de Metropolis, que ganhou animê em 2001, uma obra-prima que para a sua produção contou com uma equipe de estrelas como o diretor Rintaro, Katsuhiro Otomo, como roteirista, a animação ficar a cargo do estúdio Madhouse com suporte conceitual da Tezuka Productions.





LUZES DA CIDADE

País: EUA

Ano: 1931

Já havia assistido antes? Não


Luzes da Cidade é o quintessencial filme de Charlie Chaplin, o mais perfeitamente elaborado e satisfatório de todos os seus filmes, e também o mais representativo de todas as diferentes texturas e tons pelos quais o inigualável ator é lembrado, o sentimento, a farsa e a irreverência, o melodrama e os comentários sociais. 

As observações sociais mais destacáveis no filme do personagem interpretado por Charlie Chaplin estão na forma um par de relacionamentos com dois indivíduos: uma florista cega (Virginia Cherrill) e um milionário alcoólatra e de tendências suicidas (Harry Myers), cujas respectivas incapacidades permitem que eles aceitem o inaceitável. Sempre que o milionário está sóbrio ele expulsa Chaplin da sua presença, mas quando bêbado ele o recebe como um amigo. A garota cega, também, faz amizade com Chaplin, embora, se ela pudesse vê-lo, presumivelmente não teria nada com ele.

No entanto, ironicamente, suas cegueiras permitem que eles vejam o como ele realmente é, um sujeito com um coração de ouro que salva repetidamente a vida do milionário mesmo diante de muito perigo para si mesmo, e que está disposto a arriscar tudo para dar à garota cega uma chance de vê-lo, mesmo com a possibilidade de perdê-la. 

A emoção da cena final inesquecível e delicadamente avassaladora. Os espectadores iniciantes certamente devem segurar a respiração em antecipação, imaginando se a cena terminará em realização feliz ou ironia cruel.





TEMPOS MODERNOS 

País: EUA

Ano: 1936

Já havia assistido antes? Não


Filmes mudos já estavam fora de moda em 1936, quando Charlie Chaplin completou seu último filme mudo, Tempos Modernos. Um filme mudo conscientemente feito para a era do som, uma obra-prima cômica que permanece acessível hoje até mesmo para os amantes de cinema criados em imagens de computador e som surround.

Em parte, isso se deve às concessões de Chaplin à nova era: O filme tem uma trilha sonora sincronizada, incluindo efeitos sonoros e diálogos limitados baseados em "efeitos sonoros", bem como a própria partitura de Chaplin (a música sempre foi integral para filme "silencioso") e uma canção mesmo muito única escrita e cantada por ele mesmo, que de alguma forma inventa para não conter o que normalmente seria chamado de letras. Chaplin assim escreveu, dirigiu, estrelou, produziu, cantou e dançou em Tempos Modernos, sem mencionar fazer suas próprias acrobacias, incluindo algumas patinações extremas e um mergulho de cabeça em alguns centímetros de água.

Outro fator na acessibilidade contínua de Tempos Modernos é a influência duradoura do trabalho de Chaplin. Mais de uma cena do filme parecerá estranhamente familiar para os espectadores modernos que o assistem pela primeira vez. 

Mas a razão mais importante para a relevância contínua do filme são seus temas contemporâneos e perspectiva de futuro. A famosa cena de abertura simbólica, com imagens de ovelhas se aglomerando através de uma passagem se dissolvendo em imagens de trabalhadores saindo de uma estação de metrô, não perdeu nada de seu impacto. De fato, os espectadores contemporâneos facilmente farão a conexão entre a imagem de Chaplin e o mundo dos recintos e passagens tão familiares aos moradores do cubículo da América corporativa.

Outra cena inicial mostra Chaplin tentando fazer uma pausa durante o horário de trabalho no banheiro quando na tela de um grande monitor na parede surge a imagem da cabeça do seu chefe ordenando que ele pare de enrolar e volte ao trabalho. O público moderno que assiste a esta cena pode refletir com tristeza sobre a realidade cotidiana da vigilância eletrônica no local de trabalho, talvez nem mesmo percebendo que a sequência foi filmada décadas antes da televisão viável.

Como todos esses exemplos sugerem, Tempos Modernos olha para o futuro, mas não com entusiasmo. Muitas vezes descrito como uma sátira da era das máquinas, o filme tem de fato um tema mais amplo: os efeitos desumanos de muitos aspectos da modernidade, incluindo industrialização, burocracia, urbanização e aplicação da lei.

Obviamente Chaplin não era contra o progresso ou a tecnologia, afinal, o cinema em si, mesmo o cinema silencioso, é um meio quintessencialmente moderno. E não é preciso dizer que a era moderna trouxe muitos avanços extraordinários em áreas como medicina, produção de alimentos, e assim por diante. É fácil imaginar alguém fazendo um filme chamado Tempos Antigos destacando as dificuldades da vida em condições pré-modernas. Ainda assim, mesmo que decidamos no final que, considerando tudo, preferimos a qualidade de vida de hoje à de períodos anteriores, isto não deve nos impedir de reconhecer os males sociais e falhas do nosso próprio dia-a-dia.

Um tema recorrente em Tempos Modernos é o fenômeno do desemprego. Agora, obviamente não há nada de novo sobre pobreza e fome generalizados, mas o desemprego como o conhecemos hoje é um desenvolvimento relativamente recente, um subproduto da economia moderna da força de trabalho que exige que todos "consigam um emprego". Nas sociedades pré-modernas, em geral, o desafio para pessoas capazes era muitas vezes menos "encontrar trabalho" do que ser capaz de sobreviver no trabalho que se fez.

Muitos brasileiros estão hoje em condições de ter que roubar para sobreviver como a personagem do filme vivida pela belíssima Paulette Goddard, esposa real de Chaplin na época ou como os assaltantes que ele encontra enquanto trabalha como segurança, um dos quais diz melancolicamente: "Não somos ladrões - estamos com fome". Esta afirmação tem alguma justificativa no ensino moral tradicional, que define o roubo como usurpar a propriedade de outro contra a vontade razoável do proprietário, com a condição de que aquele em perigo de morte por falta de comida, ou sofrendo qualquer forma de necessidade extrema, pode legalmente tomar de outro tanto quanto é necessário para atender sua angústia atual, mesmo que a oposição do possuidor seja inteiramente clara. A razão tem a ver com a hierarquia dentro do direito natural. O roubo é uma violação do princípio da propriedade privada, mas esse princípio é subordinado a uma lei superior: o destino universal dos bens criados.

Por uma questão de necessidade prática, o destino universal dos bens criados é servido pelo princípio da propriedade privada, que incentiva todos a trabalhar em benefício próprio, ajudando assim a garantir que os bens do mundo sejam devidamente desenvolvidos e apreciados por todos. No entanto, nos casos em que as circunstâncias impedem que determinados indivíduos adquiram o que precisam para sobreviver, o princípio da propriedade privada pode dificultar em vez de servir ao destino universal dos bens criados.

O filme de Chaplin brinca com o comunismo como uma alternativa à injustiça do desemprego em uma sociedade sem redes de segurança. Naqueles dias pré-Guerra Fria, as simpatias comunistas eram mais socialmente aceitáveis, e, afinal, a América precisava desenvolver estruturas sociais que tornariam o desemprego mais viável e menos desumano. Apesar de sua consciência social, Tempos Modernos não se transforma em um tratado ou drama político, mas permanece muito mais uma tradicional tragicomédia. Chaplin aborda o desemprego e outras questões sociais, mas o faz obliquamente, com um leve toque, no contexto das desventuras cômicas de seu personagem.

Chaplin nos dá uma cena clássica após a outra: a demonstração da máquina de alimentação, a curta carreira como funcionário de um estaleiro, a hora do almoço na fábrica com o supervisor do preso em uma máquina gigante, e, claro, o número climático de música e dança, no qual a sua voz real é finalmente ouvida, mas a regra do filme contra palavras vocalizadas permanece intacta.





ROMA, CIDADE ABERTA

País: Itália

Ano: 1945

Já havia assistido antes? Sim


Desenvolvida em Roma durante a ocupação nazista, filmada na Cidade Eterna logo após a retirada nazista, este filme de Roberto Rossellini surpreendeu o público em todo o mundo que viu nele uma autenticidade não mediada mais evocativa da qualidade documental dos noticiários em tempo de guerra do que da artificialidade de dramas anteriores e mais convencionais da Segunda Guerra Mundial.

Em retrospectiva, Roma, Cidade Aberta é uma espécie de filme de transição, combinando elementos do que seria chamado de neorrealismo italiano com elementos do melodrama tradicional do estúdio. Suas cenas foram filmadas em sets, mas Rossellini também fez uso de ruas romanas ainda devastadas pela guerra que nunca poderiam ter sido duplicadas em estúdios, com becos cheios de escombros e edifícios marcados. Alguns espaços, como a escadaria triangular em um prédio de apartamentos, tornam-se tão familiares que sentimos que sabemos exatamente onde e como a ação se desenrola.

Atores profissionais desempenharam vários dos papéis principais, incluindo Anna Magnani, como a noiva grávida Pina, e Aldo Fabrizi, como o padre heroico Don Pietro, mas muitos dos atores anônimos poderiam ser ditos estar interpretando a si mesmos, e cenas como o saque da padaria definitivamente são do tipo Hollywood. As principais figuras nazistas - o brutal Major Bergmann (Harry Feist), a predatória Ingrid (Giovanna Galletti) - são vilões estereotipados, decadentes e sutilmente sexualmente depravados (em contraste com Pina e seu noivo viril (Marcello Pagliero), o líder partidário Giorgio Manfredi. Mas não há nada de inautêntico sobre os vilões de patente na grande peça do filme.

O coração moral da história, co-escrita por Rossellini e Federico Fellini, é sua celebração humanista da solidariedade unindo todos os tipos de cidadãos italianos - civis comuns como Pina, partidários comunistas como seu noivo Giorgio Manfredi (Marcello Pagliero), monarquistas como as forças invisíveis de Badoglio, o clero com Don Pietro, e até mesmo crianças como o filho de Pina Marcello (Vito Annichiarico) - contra o reinado racista do terror representado pelos nazistas. O engajamento do comunista Manfredi e da menos devota, mas ainda católica Pina, que planeja se casar com Don Pietro em vez de um oficial fascista, é um símbolo dramático dessa solidariedade.

O filme apresenta Don Pietro como um pouco ineficaz e distraído arbitro de um jogo de futebol masculino. Mais tarde, em um momento divertido, Don Pietro para em uma loja para pegar dinheiro e contrabandeá-lo para o movimento de resistência, onde ele desconfortavelmente contempla uma pequena estátua de São Rocco um pouco perto demais de uma outra estátua feminina de um nu voluptuoso, e tem que fazer dois ajustes antes que ele esteja convencido de que a castidade do santo é adequadamente honrada.

À medida que o filme continua, no entanto, o padre se torna uma figura cada vez mais heroica, confiando em seus privilégios clericais para tratar dos negócios da resistência mesmo após o toque de recolher. Na cena da invasão no prédio de Pina, Don Pietro corajosamente passa por soldados nazistas no prédio evacuado, sob o pretexto de administrar a unção dos enfermos a um homem doente terminal, mas na verdade pretendendo impedir que o jovem que integrava a multidão da rua venha à óbito ao atacar os nazistas com armas de contrabando. Embora a cena termine em outra nota cômica, a frieza do padre sob pressão é estabelecida - e quando ele e outras figuras da resistência são presas, a frieza de Don Pietro torna-se a determinação moral de um mártir em seu último julgamento. 

Na sede nazista, enquanto Manfredi está sendo torturado na sala ao lado, o Major Bergmann tenta jogar Don Pietro contra Manfredi dizendo: "Ele é um subversivo e um ateu - seu inimigo". "Eu sou um padre católico", responde Dom Pietro calmamente, "Acredito que qualquer um que luta por justiça e liberdade caminha nos caminhos do Senhor. E os caminhos do Senhor são infinitos." Este "batismo" do líder partidário ateu é aumentado à medida que o corpo despido e espancado de Manfredi é pressionado na forma de uma cruz contra a parede, como uma figura de um Cristo secular.

No final, quando o padre prevê que Manfredi não falará - acrescentando que rezará por ele - o conflito entre as visões de mundo nazistas e católicas chega ao silêncio de um partidário marxista. "Tenho um homem que deve falar antes do amanhecer", confidencia Bergmann a um oficial mais velho, Hartmann, "e há um padre que está orando por ele." Quando Hartmann pergunta se Manfredi pode não falar, Bergmann dispara: "Isso significaria que um italiano é tão bom quanto um alemão! Significaria que não há diferença no sangue de uma raça escrava e de uma raça mestre! Qual seria o objetivo de nossa luta?" Hartmann, porém, viu demais para aceitar a linha partidária. Ele lutou na primeira Guerra Mundial; ele viu patriotas franceses morrerem sem falar. "Nós, alemães, simplesmente nos recusamos a perceber que as pessoas querem ser livres", diz ele ao escandalizado Bergmann.

A fé de Don Pietro, e a sensibilidade católica teimosa dos soldados italianos na cena climática, dão um sentido triunfante de elevação espiritual ao que de outra forma seria um final meramente desanimador e desafiador. Temas religiosos, morais e políticos se entrelaçam até o fim: os meninos que assistem do lado de fora da cerca assobiam uma melodia partidária, seja para chacoalhar os soldados ou para encorajar o padre, que usa segundos extras para sussurrar as repetidas palavras de perdão pronunciadas pela primeira vez da Cruz de Cristo, de acordo com a narrativa bíblica. O último tiro apresenta proeminentemente a Basílica de São Pedro, nomeada para o apóstolo declarado como uma rocha, no horizonte sobre os meninos, enquanto eles vão em seu caminho, a próxima geração na luta por justiça e liberdade.





O PAGADOR DE PROMESSAS

País: Brasil

Ano: 1962

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"O Pagador de Promessas" é um filme brasileiro produzido em 1962, escrito e dirigido por Anselmo Duarte, baseado na peça homônima do dramaturgo Dias Gomes. Ganhador da Palma de Ouro, o principal prêmio do Festival de Cannes, na França, um dos festivais de cinema mais prestigiados e famosos do mundo. Brasil e Estados Unidos são os únicos países do continente americano a ganhar a honraria. Também se tornou o primeiro filme da América do Sul a ser indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro na edição de 1963. Em novembro de 2015, ficou em nono lugar na lista dos 100 melhores filmes brasileiros, segundo a Abraccine.

Na década de 1960, Zé do Burro (Leonardo Villar), um homem humilde, enfrentou a intransigência da Igreja quando tentou cumprir a promessa feita em um terreiro do Candomblé, que era carregar uma cruz de madeira pesada para uma longa viagem no interior da Bahia. Seu melhor amigo é um burro chamado Nicholas. Quando o burro adoece, ele não pode fazer nada para fazer o animal melhorar, então ele faz uma promessa a uma Mãe de Santo do Candomblé: se o burro se recuperar, ele promete que dividirá sua terra igualmente entre os mais pobres e levará uma cruz de sua propriedade para a Igreja de Santa Bárbara, em Salvador, onde ele vai oferecê-la ao padre local. 

Assim que seu burro se recupera, Zé começa sua jornada. Fielmente seguido por sua esposa Rosa (Glória Menezes), Zé chega ao templo de madrugada. O padre local, que representa a autoridade da religião oficial, se recusa a receber a cruz de Zé depois de ouvir dele a razão pela qual ele a carregou e as circunstâncias "pagãs" sob as quais a promessa foi feita, tornando sua realização impossível. 

Todos em Salvador tentam tirar vantagem do inocente e ingênuo Zé. Praticantes de candomblé querem usá-lo como líder contra a discriminação que sofrem da Igreja, jornais sensacionalistas transformam sua promessa de dar terra aos pobres em um grito pela reforma agrária, assunto ainda muito controverso no Brasil. Zé insiste em entrar na Igreja e recebe apoio da população pobre, que acredita ter ele o direito de pagar sua promessa, criando assim uma situação de conflito com o padre. 

A polícia é chamada para impedir a entrada de Zé e ele acaba morto em um violento confronto entre a polícia e manifestantes que o apoiam. Na última cena do filme, os manifestantes colocam o corpo de Zé em cima da cruz e forçam seu caminho para dentro da igreja.

O elenco e a direção do filme são todos impecáveis e a interpretação de Leonardo Villar é tão emocionante que pode arrancar lágrimas do mais durão dos espectadores. É muito triste ver como hoje a cultura brasileira parece mais uma espécie de obituário. Saudades de Leonardo Villar e de tantos outros grandiosos artistas que nos deixaram.





O HOMEM QUE NÃO VENDEU SUA ALMA

País: Reino Unido

Ano:1966

Já havia assistido antes? Sim


Quem é você, afinal? O que define você? O que faz de você você? Não me fale sobre seu trabalho, sua família, seus hobbies ou interesses. Todos eles são reféns das circunstâncias, sujeitos a mudanças. Dado o preço certo, as circunstâncias certas, você pode deixar seu emprego. Sua família pode ser tirada de você, ou você deles. Por mais importantes que sejam essas coisas, elas são, em princípio, transitórias. Há algo em você que não seja transitório, não refém da circunstância, não sujeito a renegociação ou compromisso? Há alguma coisa, por exemplo, que você nunca poderia, em hipótese alguma fazer, independentemente do preço, ou qualquer pressão que possa ser feita sobre você? Se não há nada assim então você é realmente alguém? Você tem uma identidade, um eu? Ou apenas uma configuração específica nas condições atuais?

O homem que não vendeu sua alma é a história de um homem que sabe quem ele é. O filme de 1966, que ganhou seis Oscars, incluindo melhor filme e melhor ator (Paul Scofield), é brilhante e convincente, tem sabedoria genuína e sagacidade. O roteiro, bem adaptado por Robert Bolt de sua própria peça teatral, é ferozmente inteligente, profundamente impactante, ressonante com beleza verbal e graça. 

Thomas More sobe ao posto de Lorde Chanceler da Inglaterra antes de se desentender com o rei Henrique VIII sobre o seu plano de terminar seu casamento com Catarina de Aragão e se casar com Ana Bolena. Quando os bispos ingleses rompem com Roma e Henrique é declarado "Chefe Supremo da Igreja na Inglaterra", More, um católico fervoroso e piedoso, desiste de seu alto cargo e de todas as regalias que o mesmo proporciona. Para preservar sua liberdade e proteger sua família, ele também desiste de sua vida política e pública, tentando manter um perfil discreto.

Mas Sir Thomas é muito conhecido por abandonar a vida pública e seu silêncio é amplamente interpretado como desaprovação, tornando-se uma fonte de ansiedade privada e constrangimento público para o rei Henrique. O que se segue é um fascinante jogo de gato e rato, uma caça da raposa, com More como a raposa astuta e esquiva usando todos os truques para iludir os cães do rei que buscam seu sangue. 

More é um advogado brilhante, e sua defesa é legal: se ele mantiver seu silêncio, ele não pode ser acusado de se opor ao rei. Mas logo isso não é mais suficiente e ele deve desistir de sua liberdade e propriedade para salvar seu pescoço. E quando nem isso é suficiente, para preservar sua integridade, aceita entregar a sua vida porque há algo que ele nunca fará: ele não fará o juramento que aceita o título do Rei e o novo casamento.

Tudo isso é estranho à nossa era, quando a capacidade de celebridades e políticos de se reinventarem é amplamente considerada como uma habilidade básica de sobrevivência, e chegar ou manter o poder ou a fama é o bem mais alto. Quando um brilhante e carismático advogado se torna o mais alto funcionário do governo de seu país, e é então acusado e julgado por um crime, não esperamos que ele esteja tão preocupado com perjúrio ao ponto de escolher sacrificar sua carreira, renda, status social, liberdade e, eventualmente, sua vida. A menos, é claro, que você queira realmente se comprometer. Quando é dito que sua garantia mais solene está vazia, que você é incapaz de atestar o ponto em questão, é como ser dito que você não é ninguém, que não tem caráter, nenhuma identidade, nenhuma alma.

Há, de fato, um personagem a quem More diz isso: Richard Rich, um jovem superficial que no final tem uma mão na ruína de More. Rich quer um emprego no tribunal, mas More, sabendo da sua falta de caráter, não vai colocá-lo onde ele será tentado. Rich implora e implora, finalmente professando fervorosamente que "seria fiel". More olha nos olhos dele e diz deliberadamente: "Richard, você não poderia responder por si mesmo, mesmo esta noite." E naquela noite Rich prova que More estava certo. Ele é uma espécie de inverso de More: À medida que a integridade de More retira seus bens materiais, mas expõe as suas virtudes cada vez mais heroicas, a falta de substância de Rich faz com que ele aumente rapidamente em riqueza e status à medida que ele se torna cada vez mais corrupto.

Este é um grande filme. Acredito que é a representação cinematográfica mais profunda da vida de um santo. O fato de ter sido escrito por um não-cristão também serve para tornar mais evidente o poder convincente da fé e da virtude de More, um homem cuja luz interior é tão radiante que mesmo incrédulos são atraídos para homenageá-la. O mesmo pode ser dito de Joana D'Arc, que tanto deslumbrou Mark Twain que ele escreveu sua história de vida em uma de suas melhores obras.






AKIRA

País: Japão

Ano:1988

Já havia assistido antes? Sim


Akira começa em 1988 com uma imagem chocante: uma explosão maciça, aparentemente atômica, entra em erupção no centro de Tóquio e inflama a Terceira Guerra Mundial. Depois que a guerra e mais de trinta anos, Neo-Tóquio cresceu dos escombros em uma metrópole de luzes brilhantes e arranha-céus impossivelmente altos. Manifestações políticas enchem as ruas, e forças do governo militarista recorrem à violência extrema para detê-los. Gangues de jovens motoqueiros agitam as rodovias e se envolvem em batalhas de estradas. E experiências secretas do governo resultaram em crianças estranhas e distorcidas com poderes incríveis. Este é o assustador e emocionante mundo cyberpunk criado por Katsuhiro Ohtomo, o artista de mangá e diretor de animê cuja visão inspiraria inúmeros outros artistas japoneses e diretores de cinema de Hollywood nos anos seguintes. Seu filme, lançado em 1988 e ainda considerado como um dos mais importantes animês já lançados, transcende as limitações através de seu incrível valor de produção, influência substancial, designs inesquecíveis e um comentário duradouro sobre o estado da identidade cultural japonesa.

Otomo publicou pela primeira vez seu mangá Akira em 1982 nas páginas da Youth Magazine, publicada por Kodansha. Fundamentada no subgênero ciberpunk, suas raízes mais prevalentes estão no livro Neuromancer (1984), de William Gibson, a série planejada de seis volumes de Otomo não seria concluída até 1990, após mais de 2000 páginas publicadas. No entanto, como em muitas séries populares de mangá, seu autor foi eventualmente abordado para traduzir sua história em um animê antes do mangá ser concluído. Outro exemplo notável dessa tendência pode ser encontrado em Nausicaä of the Valley of the Wind de Hayao Miyazaki, o mangá publicado pela primeira vez em 1982, com filme lançado em 1984. 

Mas a visão de Otomo era muito grande para qualquer estúdio de produção, e ele, que exigia controle criativo, não aceitaria menos do que uma realização completa de sua visão. E assim, um comitê foi formado, representando um conglomerado de empresas japonesas — incluindo Toho Co., Ltd., Bandai Co., Ltd., a editora Kodansha Ltd., e várias outras — determinadas a financiar e coproduzir o mangá de Otomo em um projeto sem precedentes de US$ 11 milhões, composto por 160.000 células de animação meticulosamente detalhada, que fez oito vezes seu orçamento na bilheteria internacional.

O filme começa quando uma gangue de motoqueiros adolescentes liderados pelo amigo Kaneda, envolve outro grupo chamado Clowns. Durante a briga na estrada, o melhor amigo temperamental de Kaneda, Tetsuo Shima, se acidenta ao entrar em contato com um menino de aspecto curiosamente envelhecido e dotado de poderes telecinéticos. De repente, naves do governo chegam para levar Tetsuo e o garoto enrugado. A gangue de Kaneda passa por interrogatório, sem saber que o garoto era um cobaia movido por rebeldes de uma instalação do governo onde cientistas tentam imbuir crianças especiais, chamadas Espers, com "o poder de um deus".

Tetsuo logo passa pelos mesmos experimentos sob a supervisão do Dr. Onishi e seu comandante militar Coronel Shikishima, que tentam replicar o poder indefinível de um Esper chamado Akira, um menino cujos poderes eram tão grandes que causaram a explosão em Tóquio décadas antes. Mas as habilidades naturais de Tetsuo são desencadeadas pelo Dr. Onishi e rapidamente se tornam instáveis e incontroláveis, transformando-o em um maníaco violento, alucinante e faminto por poder determinado a colocar Akira, que sobrevive apenas como órgãos dissecados contidos em frascos, livre de sua prisão subterrânea criogênica. Enquanto isso, Kaneda se interessa por Kei, uma membro de uma facção rebelde determinada a desestabilizar o governo corrupto e irresponsável. Kei e Kaneda logo percebem que ambos estão atrás da mesma coisa, embora não ideologicamente. Quando descobre o que aconteceu com Tetsuo, Kaneda se junta aos rebeldes para recuperar seu melhor amigo e impedi-lo de destruir toda Neo-Tóquio.

No animê, o realismo e o estilo têm uma estranha interação que continua sendo seu motivo visual definidor. Com suas raízes no mangá, o artista de animê comanda ambos os elementos e assume o controle completo. No caso de Akira, o realismo de Otomo se apresenta na forma de imagens pintoras que retratam a incrível paisagem iridescente da cidade de Neo-Tóquio, as imagens apenas um pouco menos fantásticas do que a visão futurista de Ridley Scott para sua Los Angeles inspirada em Tóquio em Blade Runner (1982). Por outro lado, Otomo emprega uma estilização mais cômica em outros lugares, particularmente nas cenas menos pesadas e mais acionadas ou de alívio cômico envolvendo Kaneda. O animê muitas vezes tem essas justaposições de estilo e tom, mas poucos se misturam, bem como a abordagem de Otomo em Akira.

O resultado é inspirador e completamente imersivo. Ao mesmo tempo, o alcance de Otomo, dada a sua abordagem inquestionavelmente cinematográfica, torna-se evidente em todos os lugares, desde inúmeros outros filmes de animê, como Ghost in the Shell (1995), até obras live-action como Matrix (1999) e O Quinto Elemento (1997). Mas o filme é muito mais do que visuais atraentes, conceitos de ficção científica e ação de motocicletas.

É impossível assistir às cenas de abertura de Akira e não pensar imediatamente no bombardeio dos Estados Unidos em Hiroshima e Nagasaki na Segunda Guerra Mundial. Nos próximos anos, o Japão pós-guerra cresceria superpovoado e ocidentalizado. O crescimento econômico desenfreado do país levaria ao que é considerado a epítome das cidades futuristas: Tóquio moderna — uma orgia metropolitana de luzes de neon e ruas movimentadas. Desenvolvida e exagerada na ficção científica e no mangá, a Tóquio do futuro se torna um epicentro metafórico para tudo de errado com o Japão pós-guerra, como a identidade nacional é deformada e talvez perdida no desejo de reconstruir sem restrições. A humanidade e certas liberdades se perdem nesse processo, mas a tecnologia e os requisitos visionários necessários para dar forma ao futuro inegavelmente encantam. No entanto, por mais que Akira critique o Japão pós-guerra e a reformulação da cidade e da cultura da época, seus efeitos sobre os seres humanos são muito mais invasivos.

Além da tecnologia, o indivíduo passa por uma reconstrução semelhante nas mãos de Otomo, especificamente em Tetsuo. Sequestrado e sujeito a experiências desconhecidas, Tetsuo alucina em imagens de sonhos que assustariam Dali. Em uma sequência sangrenta, suas entranhas derramam no chão em uma pilha, e ele tenta desesperadamente puxá-las de volta para dentro; outra sequência mostra um sonho noturno onde projeções de animais de pelúcia se transformam em monstros imponentes. A mente de Tetsuo começa a se expandir. À medida que desenvolve poderes telecinéticos, ele age em demonstrações de violência e destruição. Ele perde todo o sentido de sua história e devoção aos seus amigos. O próprio Tetsuo pode ser uma metáfora para o Japão pós-guerra, ficando fora de controle. 

Em termos menos gráficos, Akira representa sua juventude como rebeldes contra a cultura lutando contra o sistema ou envolvidos em gangues criminosas, de qualquer forma contra a autoridade em todas as formas. Esta é a tragédia do futuro de Otomo no que se refere aos seus personagens, apresentando uma alegoria cínica de como o Japão pós-guerra tem sido irrecuperavelmente influenciado, corpo e alma.

Mais de 3 décadas depois, Akira, de Katsuhiro Otomo, ainda inspira admiração. Hollywood tenta por mais de uma década produzir uma adaptação live-action (bata na madeira!), resultando apenas em falsos começos. Mas nenhuma quantidade computação gráfica cara, poder estelar (nomes envolvidos incluíram Leonardo DiCaprio, Keanu Reeves e Garrett Hedlund), ou valor de produção blockbuster poderia coincidir com a visão singular que Otomo alcançou em 1988. 

Akira permanece tão densamente mergulhado em espetáculos, ideias de ficção científica e uma sobrecarga de informações visuais que seus comentários sociais e culturais podem se perder para os espectadores mais interessados em espetáculo e menos atentos ao conteúdo. Este animê é uma conquista tão extraordinária que exige ser vista e revistada novamente para uma reavaliação em sua mais profunda relevância. E ser apreciada como um marco não apenas de animê, mas de cinema internacional.

sexta-feira, 2 de abril de 2021

FORREST GUMP E EU

Os melhores filmes de todos os tempos foram realizados durante a década de 1990.

Não tenho dúvidas disso.

Forrest Gump - O contador de histórias foi um filme realizado em 1994 e foi um dos mais importantes da minha vida. Os 40 anos da história estadunidense, da Guerra do Vietnã a Watergate, sob os olhos de um rapaz ingênuo, mas cheio de boas intenções. Apesar de participar ativamente e até influenciar alguns destes importantes acontecimentos, Forrest, em nenhum momento, esquece o seu grande amor de infância, Jenny Curran. Basicamente, um filme sobre como um homem, apesar de todas as suas limitações cognitivas, foi capaz de ter uma vida incrível!

Forrest Gump (interpretado por Tom Hanks) é um personagem conhecido e amado por todos por sua inocência e peculiaridades. Apesar de se assumir num princípio que a sua particularidade era gerada por um tipo de retardo mental, ao analisarmos cuidadosamente seu comportamento e atitudes, podemos identificar que Forrest na realidade era portador de um Transtorno do Espectro Autista (TEA).


Forrest Gump era autista?


“GUMP!!! Qual é o seu único propósito neste exército?!!! "

"Para fazer o que você me disser, sargento instrutor!!!!"

“Maldição, Gump!!! Você é um maldito! gênio!!! Esta é a resposta mais notável que já ouvi!!!! Você deve ter um maldito QI de 160!!!! Você é um maldito talentoso, soldado Gump!!!!!”


Para a maioria das pessoas, a cena entre o instrutor de exercícios do Exército e o recruta Forrest Gump foi apenas mais uma situação da série de incidentes divertidos onde Gump se encontra durante toda a sua história. Mas também é um dos muitos sinais espalhados pelo filme de que o personagem pode ser autista.

Cada vez mais têm-se abandonado o termo Síndrome de Asperger para se referir ao autismo nível 1, em especial devido ao histórico do médico Hans Asperger em colaboração com o regime nazista (denunciado no livro As Crianças de Asperger de Edith Sheffer) e por fomentar o capacitismo. Ademais, o DSM-5 tornou a designação obsoleta e o CID-11 consolidará a sua substituição.


Dentro dos critérios do DSM-5 para o autismo, descartando possíveis diagnósticos alternativos, como transtorno de Rett ou transtorno desintegrativo da infância de acordo com a observação evidências fornecidas no romance e filme, encontramos:

Critério A: Déficit persistente na comunicação e interação social em diversos contextos, manifestado pelos seguintes (atualmente ou também antecedentes):

A1. Déficit na reciprocidade socioemocional, o que pode levar a aproximações sociais anômalas e problemas para o desenvolvimento normal e seguimento da conversação, problemas para compartilhar interesses ou, como é o caso de Forrest, suas emoções e afetos, igualmente há problemas para responder as interações sociais. 

Esse déficit é sobretudo evidente na sua relação com Jenny, os amigos e companheiros dela e nas múltiplas vezes em que visita os distintos presidentes, nas quais não é capaz de ler as situações.

A2. Déficits nas condutas comunicativas não-verbais utilizadas nas interações.

Dificuldades na compreensão e uso de gestos como é o caso do personagem e falta total ou parcial de expressão facial ou comunicação não-verbal.

A3. Déficit no desenvolvimento, manutenção e  compreensão das relações sociais.

É difícil ajustar a conduta a contextos, compartilhar brincadeiras, fazer amigos e há ausência de interesses por seus iguais, como é demonstrado pelas poucas amizades que ele mantém durante toda a sua vida.

Critério B: Padrões restritivos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades que se manifestam em dois ou mais dos seguintes pontos, atualmente ou por antecedentes

B1. Movimentos, utilização de objetos ou falas estereotipadas ou repetitivas (estereotipias motoras simples, alienação a mudanças de lugar dos objetos, ecolalia, frases indiossincráticas).

B.2. Insistência em monotonia, excessiva inflexibilidade de rotinas ou padrões ritualísticos de comportamento verbal ou não-verbal (grande angústia frente a pequenas mudanças, dificuldades com as transições, padrões de pensamento rígidos, rituais restritivos, necessidade de tomar o mesmo caminho ou de comer os mesmos alimentos cada dia).

B.3. Interesses muito restringidos e fixos que são anormais quanto a sua intensidade ou foco de interesse (forte apego ou preocupação por objetos incomuns, interesses excessivamente circunscritos ou perseverantes).

Forrest apresenta uma não especificada deficiência mental que o faz diferente dos demais. Entretanto, isso também o impulsiona a querer triunfar em tudo o que faz e superar-se dia a dia, apesar das complicações tão grandes que se apresentam.


"Você só tem que ficar de olho na
bola..." 
Por algum motivo, o
pingue-pongue era muito fácil
para ele.

B.4. Hiper ou Hipoatividade aos estímulos sensoriais ou interesse inabitual por aspectos sensoriais do entorno (indiferença aparente a dor/temperatura, respostas adversas a sons ou texturas específicas, olfação ou palpação de objetos, fascinação visual pelas luzes ou o movimento).

Critério C: Os sintomas devem estar nas primeiras fases do período de desenvolvimento (mas podem não se manifestar totalmente até que as demandas sociais superem as capacidades limitadas ou podem estar mascaradas aprendidas em fases posteriores da vida).


Ver minhas fotos antigas é uma experiência esclarecedora.
Nunca olhava para as pessoas atrás da câmera, tinha um olhar
sem vida, duro como estátua, ausência do sorriso social e,
quando eu me forçava a sorrir, fazia uma careta. 

Critério D: Os sintomas causam deterioração clinicamente significativo no social, laboral e outras áreas importantes do funcionamento habitual.

Critério E: Essas alterações não se explicam melhor pela descapacitada intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento. A incapacitação intelectual e o TEA frequentemente coincidem. Para fazer um diagnóstico de comorbidades de um TEA e incapacidade social, a comunicação social deve estar abaixo do previsto para o nível geral de desenvolvimento.

Quando Forrest era criança, a sintomatologia era uma marcada deficiência para a comunicação social e uma série de padrões restritivos no seu comportamento o qual dificultaram desde tenra idade seu desempenho escolar assim como suas habilidades para socializar com seus semelhantes. 


"Corra, Forrest, corra."
O pequeno Gump que mal consegue andar,
devido um problema na coluna, precisa
correr para se salvar do bullying das outras
crianças. Quando hoje vejo o filme,
lembro do meu passado, e esse é um
dos momentos que mais me tocam.

Forrest cumpre o critério D, apresentando uma disfunção clinicamente significativa ainda que seja um personagem altamente funcional com múltiplas compensações que facilitam a sua comunicação com os outros e com muitas dificuldades para compreender situações sociais as quais afetam suas relações sociais e limitam o número de pessoas com as quais consegue se relacionar o que gera muito mal-estar emocional.


Quando acompanhei a jornada do personagem na década de 1990, ainda era uma criança e me identifiquei muito com seus valores e ideais, assim como com a tragédia e a realidade de sua vida diária. Com minha ingenuidade de criança, me diverti e ri bastante com o Forrest Gump, sem me dar conta de que estava rindo de mim mesmo.

O Forrest Gump é um personagem que amadurece em sua experiências ao longo do filme, embora permaneça sendo sempre o mesmo. É tolerante, gentil e tem uma impressionante habilidade para perdoar e aceitar as diferenças, em outras palavras, Forrest Gump é idêntico ao meu eu criança e adolescente.

Não escrevo isto apenas pelo fato de hoje conhecer no meu autismo a resposta para todas as situações as quais vivenciei. Forrest Gump lembra muito a mim mesmo da complicada fase adulta, por isso escrever sobre um filme como esse implica ter que aprofundar situações difíceis e dolorosas, mas sem dúvida alguma, cale a pena porque deixam um ensinamento muito valioso.

O que chama muito a atenção, é observar a perseverança que Forest Gump tem frente a vida e possui qualidades como o amor, a humildade, a entrega, a força e uma grande generosidade. O mesmo tempo, é um homem que mantem uma visão muito inocente sobre as personas e portanto, é muito difícil crer na maldade humana. Isto muitas vezes lhe causa dor e conflito, mas o mais importante é que nunca deixa de lutar e de empreender os sonhos que tem.

Um elemento central do filme é a influência que tem a família sobre o ser humano ao longo da vida. Forest Gump sempre se mostra próximo a suas convicções e da educação que durante a infância recebeu de seu mãe.

O protagonista é muito inteligente, diferente da impressão que a maioria das pessoas tem dele, porque sempre se adapta as situações que em que se encontra. Nos dá lições muito importantes através da perseverança e da valentia. Também podemos ver a bondade em suas intenções e em cada um de seus atos. Demonstra uma grande lealdade, já que apesar das humilhações, não deixa a seus amigos em nenhum momento.

Aprendemos aquilo de mais valor na vida: a qualidade humana. Nos faz refletir sobre o tratamento que como pessoas todos merecemos e por último, podemos apreciar que a vontade e a fortaleza, são capazes de alcançar qualquer objetivo.

O filme assegura que Forrest apresenta uma deficiência intelectual, mas não é evidente que ele tenha deficiências em suas funções intelectuais e de ele fato foi capaz de concluir os seus estudos tanto básicos como superiores sem aparente dificuldade e por isso não cumpre com os critérios para um transtorno de desenvolvimento intelectual.  

Nem o autor Winston Groom, nem a estrela Tom Hanks ou o diretor Robert Zemeckis jamais comentaram sobre sua opinião sobre se Forrest deveria ou não ser retratado como autista. Na verdade, na época em que Groom publicou o romance, em 1986, o autismo ainda era mal compreendido e não amplamente reconhecido pela maioria das pessoas. 

Caso soubéssemos do verdadeiro final da história do personagem, ele certamente deve ter terminado a sua vida desconhecendo a sua própria deficiência. O meu caso é parecido, vivendo 3 décadas da minha vida no mesmo desconhecimento. Forrest Gump e eu enfrentamos uma sociedade que vê nossas características autistas como fraqueza ou mesmo desvio de caráter e, além disso, que prega que homens dignos, íntegros e virtuosos teriam um comportamento oposto ao nosso.

Eu me identifico muito com Gump em suas adoráveis e destacáveis características presentes em sua história e também muito comuns às pessoas autistas, especialmente às crianças autistas: somos menos preconceituosas e mais aceitadores das diferenças, somos verdadeiros e não somos inclinados a praticar bullying, questionadores das autoridades quando estas são injustas, honestos e leais, atenciosos à detalhes, observadores e mais perdoadores àqueles que erram e se desculpam, somos menos propensos a sermos antiéticos e somos empáticos a nossa maneira. Por estas características, Gump conquistou muitas pessoas, mesmo o amargurado tenente Dan, que, à sua maneira, demonstrou gratidão por ter a sua vida salva, em uma das cenas mais emocionantes do longa.


Winston Groom, autor de Forrest Gump.

Teria sido extraordinário se Winston Groom tivesse criado o personagem com o autismo em mente e todas as evidências apontassem para a ideia de que ele simplesmente pretendia que Forrest Gump fosse um indivíduo de baixo QI que tropeçou em alguns dos eventos mais históricos da história recente. Mas uma coisa sobre arte e literatura é que ela está constantemente em processo de reavaliação e interpretação por parte do público e da crítica. Para muitas famílias e profissionais (como analistas de comportamento aplicado) que trabalham regularmente com indivíduos no espectro do autismo, os comportamentos de Gump atingem um ponto de reconhecimento.


"Idiotas são os que dizem idiotices"


Gump passa pela vida como um trapalhão inepto, alheio aos sinais e normas sociais, mas possui a capacidade de se concentrar em detalhes técnicos e seguir instruções claras com precisão de laser. Vê-lo desmontar e remontar um rifle de batalha M-14 no quartel é muito parecido com assistir um autista savant construindo castelos com Legos em precisão e velocidade fluindo de pura dedicação à tarefa.

E as pessoas com formação militar e um olho afiado que notaram as decorações no uniforme Classe A de Gump mais tarde no filme notariam que ele levou essa dedicação ainda mais longe: ele usa o maior distintivo de pontaria disponível no Exército.

Gump consegue feitos incrível com muito foco e intensidade. Seu foco em dirigir seu barco de camarão mostra comprometimento e perseverança, e, embora outros interpretem isso como pura estupidez, seu método compensa no final.




A vida é como uma caixa de chocolates


Colocado em um ambiente com regras e sistemas bem definidos, o Gump se destaca. Quando lhe é dito que a chave para o sucesso em jogar pingue-pongue é nunca tirar os olhos da bola, não há um segundo de tempo de jogo em que ele o faça. Além disso, sua prática é obsessiva, tanto com outros jogadores quanto por conta própria, por horas e horas... o suficiente para levá-lo à China para competir pelos Estados Unidos na diplomacia do pingue-pongue.

Analistas do comportamento aplicado que trabalham com pacientes autistas já viram esse tipo de foco antes e podem muito bem ter feito o mesmo uso dele que o instrutor de exercício de Gump e os professores de pingue-pongue fizeram. Eles também viram muitos pacientes com TEA que têm um tipo de energia nervosa, um tipo de hiperatividade e movimentos motores repetitivos que os analistas tentam redirecionar para comportamentos mais saudáveis... correr, por exemplo, assim como Forrest faz.

A capacidade de canalizar os comportamentos obsessivos em ações positivas é algo que a mãe de Forrest tem em comum com os esses analistas de comportamento. A lição dela para o seu filho, incentivando-o a abraçar a vida e aceitar que "você nunca sabe o que vai conseguir" é uma boa lição para todos, autistas ou não, se lembrarem.

sábado, 31 de outubro de 2020

10 CONCEITOS MAIS ASSUSTADORES PARA VILÕES DOS TOKUSATUSUS

É o Dia das Bruxas e o dia do Saci também para nós brasileiros, instituído pela lei federal 2762 de 2003, com o objetivo de resgatar o folclore nacional em contraposição ou Halloween de tradição celta. Isso significa monstros, monstros e mais monstros! E não há mais monstros do que os programas japoneses de Tokusatsus. 

Caramba, a maioria deles vem com um novo a cada episódio!

Muitos destes "toku-monsters" podem ser suficientemente assustadores para a data do Halloween. 

O blog já conta com uma postagem acerca dos monstros mais perturbadores criados para a franquia Ultraman, mas esta postagem apresenta as criaturas do terror Tokusatsu assustadoras não somente em aparência, se não também no seu conceito. 

Sendo assim, alguns monstros da franquia Ultraman que não aparecem na outra postagem, podem encontrar um espaço especial nesta.

Embora muitos destes sejam galhofeiros ou mesmo bobos, há na mesma medida, para cada mutante de batom ou dinossauro de látex, figuras que carregam um fator legítimo de terror. 

A ordem dos elementos da lista pode parecer incongruente para alguns, mas foi proposital para o debate. Muitas vezes, um personagem precisa de muito mais do que um rosto asqueroso e um corpo melequento para causar terror, muitos personagens assim acabam flertando com o "terrir". 

Mesmo que alguns não tenham uma aparência com potencial marcante para o horror que proporcione ao espectador a necessidade de um terapia, deve ser levado em consideração o conceito por trás da criação destas criaturas, o ano em que surgiram, as faixas etárias dos públicos para os quais foram destinadas e as tendências.

Personagens assustadores e eventos bizarros e subliminares podem ser muito mais impactantes em simples séries televisivas do que em Tokusatsus adultos como Garo, os quais assistimos já esperando ver cenas de terror.

Aqui estão apenas alguns monstros dos Tokusatus mais arrepiantes para o Halloween.



10º Lugar

Pain - Changeman

Monstro espacial surgido no episódio 28 de Changeman, com o célebre título A Maldição Sangrenta. Encontrar um nome desses, acompanhado de uma ilustração com o rosto da dita criatura na capa de um velho VHS de uma extinta vídeolocadora faria qualquer um fã louco por terror trash a levar para casa sem pensar duas vezes.

"É um trashão de primeira!", diria nosso amigo Edson do Terror.

Como grande parte, ou talvez todos os personagens que exercem o papel de vilões da série, Pain teve seu planeta arrasado pelo senhor Bazoo e foi enviado a Terra pelo mesmo com a missão de conquistá-la em troca da restauração do seu mundo.

Pain pode não ter o visual mais assustador que você verá em um tokusatsu, mas merece um posto nesta lista por sua habilidade assombrosa e por ser muito mais do que aparenta.

Quando o conhecemos, sentimos pena dele, como acontece com vários dos outros vilões do elenco. Pain nos é apresentado como um ser frágil, vulnerável e destruído psicologicamente, implorando misericórdia ao senhor Bazoo por todo o terror e torturas pelos quais estava sendo submetido.

Aceitando a missão imposta pelo vilão cósmico, Pain chega a Terra e muda completamente de personalidade, tornando-se um sádico, ele realmente parecia gostar muito da dor que causava nas pessoas, crianças. 

Se Pain estivesse necessitando de "passadores de pano" para seus atos indefensáveis, hoje poderia sugerir que tentasse uma carreira política no Brasil.

A técnica de Pain consistia em derramar o seu sangue sobre um inocente giz de cera de uma criança que tinha por hábito desenhar os seus amigos. Uma vez invocada a sua maldição de sangue, Pain poderia modificar os desenhos da criança, acrescentando fogo ou lâminas dolorosamente inseridas ao peito daqueles desenhados pelo giz amaldiçoado. A tática também seria usada para tentar matar Hayate, o Change Griffon.

Os afetados pelos desenhos sentiriam dores equivalentes aos efeitos representados nas imagens, daí a escolha do nome do monstro da semana, acredito, o que já é uma ideia assustadora e cruel o suficiente para merecer um lugar na lista.



9º Lugar

A Múmia - Ultraman

Quem achou uma boa ideia trazer uma múmia de uma escavação para casa? Especialmente quando a múmia tem uma cara de macaco horrível como esta. 

Os restos da uma criatura de natureza símia de 7.000 a 10.000 anos foram descobertos nas colinas de Okutama, desenterrados na década de 1960, ganham vida e atacam os funcionários de um centro de pesquisa no Japão. 

Sua cabeça é desproporcionalmente grande e desdentada e a parte inferior do seu corpo e dos seus braços estão ainda envoltas em bandagens. Esta besta com olhos de laser, após ser escavada pela Patrulha Científica, partiu imediatamente para uma matança.

Quando finalmente confrontado e destruído pelos membros da mesma patrulha, infelizmente antes que pudesse confrontar o herói da série Ultraman, sua morte de alguma forma convoca o gigante kaiju Dodongo, o seu "monstro cavalo" de sua tumba nas profundezas das colinas de Okutama. 

Apesar das lutas galhofeiras que mais lembravam um rodeio (ou rituais de magia negra), este episódio é mais lembrado pelos assassinatos super-assustadores do Homem Múmia.



8º Lugar

Giluke - Changeman

Shohei Yamamoto (1938-2019) foi o meu ator favorito do seriado Changeman, e o seu personagem, Giluke, o segundo melhor vilão, ficando atrás apenas de Ahames, que era uma perfeita mistura de personalidade, poder e beleza.

Giluke foi o comandante da nave Gozma e era originário da estrela Giraz, tendo inclusive conspirado junto com Ahames para destruir o senhor Bazoo, infelizmente fracassando e sendo obrigado a trabalhar para o vilão em troca da reconstrução de seu mundo. 

Teorizo que Giluke e Ahames possam ter sido mais do que companheiros de batalha. Os dois podem ter sido amantes, visto a maneira como o comandante de Gozma suspirava ao lembrar dela enquanto esperava por seu retorno. Ahames fazia tudo por poder, isto é, poder para reconstruir a sua estrela Amazo da qual era rainha. Seduzir Giluke seria fichinha perto das barbaridades que a moça causou.

Depois de usar Giluke como bem entendeu, Ahames não pensou duas vezes em dar um pé na bunda e roubar a aura energética da menina Nana da estrela Tequinolíquel, poder tão desejado por Giluke.

Por falhar em sua missão de eliminar os Changeman, Bazoo castigou Giluke o enviando ao cemitério espacial, local para onde todos os monstros espaciais vão antes de morrerem, sendo assim dado como morto. 
Isso era o que todos pensavam.
Ninguém esperava que o agora ex-comandante de Gozma se fundiria ao corpo de um monstro espacial moribundo antes de ambos morrerem. 
Assim, Giluke retornou ao mundo dos vivos, como uma alma penada para assombrar aos Changeman e à Ahames, que, como uma "ex" a dar o golpe, tomou tudo dele, a sua nave, os seus companheiros, o seu cargo, o seu poder...

Não subestime o fantasma Giluke por parecer um Teletube deformado. 
Ele era assustador. 
Destaco a cena em que quase assassina Hayate (O Changeman que todos os vilões querem matar) por estrangulamento.
Mais difícil de morrer do que o Freeza, o ex-comandante de Gozma teve a oportunidade de ressuscitar banhando-se na segunda aura energética emitida por Nana (que era bem mais poderosa que a primeira), através do ritual da missa negra da estrela Giraz.

Curiosidade: Surgidas desde o século III, realizadas por grupos que atacavam a Igreja com versões distorcidas das missas cristãs, as missas negras são cerimônias do Satanismo que fazem uma inversão da missa Tridentina para simbolizar a morte de Cristo sem sua ressurreição. Anton LaVey (1930-1997) fundou a primeira igreja de Satã nos EUA, a primeira organização abertamente satânica da história.

Então há a versão da missa negra alienígena do planeta do Giluke, que mais parecia uma reunião da Ku Kux Klan, em uma das sequências mais deliciosamente trash do seriado.
Giluke ressuscita com uma nova aparência, um "novo e criativo" nome e um bordão marcante, muito mais poderoso do que Ahames e com uma gargalhada de gelar a espinha do espectador, destacada pela voz de Marcos Lander (Orgulho de dublador capixaba).
O vilão volta para vingar-se dos Changeman e da mulher que partiu o seu coração.


Giluke é um homem de muitas faces: o comandante, o fantasma, o "Drácula espacial" e o monstro final da série. Pode não ser visualmente tão assustador quanto os demais da lista, mas o seu conceito, envolvendo satanismo e body horror (transformando seus ex-aliados e a si mesmo em monstros com seu novo arsenal de poderes), é simplesmente assombroso.




7º Lugar

Gaohm - Juukou B-Fighter

Lutando em uma guerra interdimensional contra um bando de jovens com armaduras de insetos? 

Se você não está vestido assim, não está fazendo certo!

Gaohm, líder do Jamahl e nêmesis de Juukou B-Fighter, é assustador de uma forma que não consigo definir. 

Há algo na sua cara que dá arrepios.

Claro, há também a maneira como sua mão em garra gigante sai das nuvens de tempestade para agarrá-lo e puxá-lo para a Zona de Gaohm, sua própria dimensão do caos pessoal. 
Sem mencionar que mais tarde ele tem uma aparição flutuando no espaço como uma espécie de leviatã Lovecraftiano. 

Cara, esse monstro era bem menos assustador em Beetleborgs.
O que estou dizendo? 
Beetleborgs já é bem mais assustador, só que no sentido negativo.




6º Lugar

Grande Líder do Shocker - Kamen Rider

Às vezes, basta um momento sólido para fazer uma declaração de horror. 

Caso em questão, o Grande Líder do Shocker de Kamen Rider de 1971. 

O Grande Líder passou 97 episódios como uma voz sem rosto saindo de um interfone, mas quando os Riders finalmente o conheceram pessoalmente no episódio 98, aqueles três minutos de tempo na tela foram absolutamente arrepiantes.

Não há luta final culminante, nem vitória heroica. 

Não há nem música, apenas risadas satânicas profundas enquanto o Grande Líder é desmascarado. 

Só conseguimos ver sua verdadeira face por alguns segundos antes que ele autodestrua sua própria base e, mesmo assim, nunca descobrimos o que ele era. 

Um alienígena? 

Um demônio? 

Um experimento científico que deu errado? 

Quem sabe. 


O Grande Líder retornaria em várias formas diferentes, mas nenhuma seria tão horrível quanto a primeira.




5º Lugar

Haru - Garo

Todos os monstros do tokusatsu adulto Garo de 2005 são bastante assustadores. 

Eles são literalmente chamados de Horrors, afinal. 
Mas nenhum tem um fator de fluência tão grande quanto Haru. 

Ela (?) é bem assustadora para um monstro peixe-sereia, porém o seu maior terror está em sua maneira de caçar as suas presas, isto é o que de fato a torna realmente assustadora. 

Já que é tipo um peixe, não pode abandonar o seu aquário e sair para comer humanos, em vez disso, seduz um cara solitário para caçar para ela, atraindo pessoas que se converterão em alimento para Haru, no melhor estilo A Pequena Loja dos Horrores.

Claro, não é tão dinâmico como alguns horror films, mas ter um cara normal encurralando você em um quarto escuro com um estilete, enquanto essa coisa nojenta assiste avidamente de um grande tanque escuro? 

Isto é o verdadeiro horror!




4º Lugar

Dada - Ultraman


Eu sei o que está pensando.

Parece só um maluco vestindo uma malha com estampa de zebra.  

Mas aparência não é tudo! 

Dada veio de uma dimensão paralela na busca por seis cobaias humanas. 
E se essa coisa estiver perseguindo você, é melhor fazer suas preces, preparar seu testamento, ou sei lá, porque provavelmente ele vai pegar você. 
Dada pode atravessar paredes, se teletransportar e mudar de tamanho à vontade.

Mas a habilidade mais assustadora de Dada é a constante transformação do seu rosto. 
Inicialmente, isso foi feito para enganar as suas presas, fazendo-as pensar que havia três seres diferentes as perseguindo. 


Assim que é ferido pelo Ultraman, porém, ele começa a mudar de rosto a cada poucos segundos. 
Há algo desorientador e perturbador em ser perseguido por algo assim. 

Seu rugido gutural terrível também não ajuda.





3º Lugar

Jisatsunoid - Jiban

Honestamente, todos os monstros do seriado Jiban são assustadores.

Kazenoid, outrora um simples boneco pertencente a uma doce garotinha, transformado pela organização criminosa Bioron em um monstro horripilante que espalha uma doença pelo ar de efeito devastador.
Chuushanoid, um monstro dotado de agulhas acopladas ao seu corpo ou guardadas em seus bolsos (?) que injeta venenos de todos os tipos de animais peçonhentos nas pessoas, um pesadelo ainda maior para quem tem medo de injeção.
Spiderblock, um criatura tão feia que nem posso descrever e que aparece no filme  Kidou Keiji Jiban: Great Explosion at the Monster Factory of Fear.
E a própria (?) Madogarbo que assassina o herói de forma brutal na metade da série (Ok, spoiler: ele ressuscita no episódio seguinte. Mas pense como foi ver aquela cena quando criança na época e não saber se teríamos o nosso Jiban de volta).

Mas nenhuma destas criaturas é um pesadelo tão horripilante quanto Jisatsunoid.

Surgindo no episódio 24, chamado Bem-vindos Ao Mundo Espiritual, Jisatsunoid é um ser perturbador em todos os sentidos. Sua aparência horrenda, como a de um cadáver em estado de decomposição, sua voz e sua personalidade.

Jisatsunoid é apaixonado de um modo quase sexual pela MORTE.

Ele se envenena aos poucos para apressar a sua morte.
Com seus poderes, pode enxergar o Mundo dos mortos, o que o faz sentir ainda mais vontade de morrer e se deliciar com os horrores e torturas as quais o aguardam naquele lugar.





Sua missão, para variar, era matar Jiban, mas Jisatsunoid desejava tornar a experiência mais divertida, morrendo junto com o herói.

O seu bordão: "Queeero morrer, queeeeero morreeeeeer".

Um demônio suicida, a criatividade do Japão não tem limites.





2º Lugar

A Mulher Aranha - Kamen Rider ZO

A Mulher Aranha foi uma das servas do Neo Organism do Kamen Rider ZO de 1993. 

Aparecendo como uma pequena aranha, ela enlaçava suas vítimas, transportando-as para um mundo alternativo cheio de teias e colunas gregas. 
Lá, ela poderia assumir sua verdadeira forma: uma aranha humanoide esquelética cheia de dentes afiados.

Projetada pelo mesmo artista dos Horrors de Gao, a Mulher Aranha é facilmente o mais assustador dos monstros do Neo Organism. E estamos falando sobre um filme com um monstro morcego que faz o truque do Homem Pálido com os olhos nas mãos em O Labirinto do Fauno. 


Ela foi renderizada por animatrônicos e stop-motion, tornando-a um dos monstros mais desumanos e assustadores de todos os tokusatsu.






Estas técnicas clássicas, já em desuso, podem produzir resultados muitos mais conviventes e arrepiantes do que as já saturadas técnicas de computação gráfica as quais já estamos acostumados a conferir no cinema moderno.




1º Lugar

Satasata - Shaider

Eu amo episódios de tokusatsu de Natal, mas, porra, este aqui é "perfeito"!

No episódio 29 da série do policial espacial Shaider, o monstro da semana criado pelos Fuuma é Satasata, criado para usar a alegre temporada de férias para deformar e corromper crianças japonesas.

Mas claro que Satasata não pode sair por aí parecendo um monstro com presas, então ele precisa assumir uma "forma mais normal" para se tornar o Papai Noel de Satanás!


O herói Shaider é convidado a ajudar a entregar presentes para um par de crianças, mas ele tem que fazê-lo da maneira apropriada e, aparentemente, o Papai Noel japonês não usa a chaminé e apenas entra por qualquer janela disponível.

Bem, poderia ser pior e pode apostar que fica.
"Satan Claus" faz o seu movimento e traz ao heróis o seu verdadeiro presente... uma péssima viagem de LSD!

Sua intenção é transformar todas as crianças no Japão e voltá-las contra o verdadeiro Papai Noel, dando-lhes presentes horríveis e assustadores. 

Parece bobo? Como você é ingênuo se assim pensar!
As cenas que se seguem são incrivelmente assustadoras e dificilmente poderiam ser transmitidas nos dias de hoje em respeito às sensibilidades de alguns espectadores.

Os produtores de tokusatusu por vezes gostam de traumatizar crianças.
Mas os produtores de Shaider devem odiar as crianças!

As crianças, que agora não estão tão empolgadas com o Papai Noel, ouvem uma música estranha, enquanto veem figuras encapuzadas em preto dançando.
Encantadas com a música, entram em fila e logo são conduzidas a um estranho altar na floresta onde Satan Claus está realizando algum tipo de serviço religioso.

O que vem então?


Um Papai Noel... crucificado... de cabeça para baixo?!
Uau, pensei que o Papai Noel deveria ser São Nicolau, não São Pedro. 

Japoneses, traumatizando a juventude desde pelo menos 1971!

A cerimônia continua com as crianças se juntando a um coro estranho e assustador e sendo transformadas em figuras vestidas de preto, mascaradas e sem rosto. 
Felizmente, Shaider chega para acabar com a festa e resgatar as crianças! 
Na manhã seguinte, ele até as devolve às suas famílias.


Porém, tudo é parte da trama de Satan Claus.
As crianças, sem nenhuma memória de seus pais, se transformam em cultistas vestidos de preto mais uma vez e se reúnem para causar confusão e destruir coisas!

Isso, é claro, leva à batalha final entre Shaider e Satasata, que tira seu disfarce de Satan Claus para utilizar seus poderes monstruosos e completos para enfrentar o homem da lei.

O resultado é bastante inevitável e o maligno Papai Noel impostor é destruído!

O Natal está salvo e enviaremos aos produtores do seu programa as contas de terapia para nossos filhos!





Hour Concour

O Deus Enguia - Patrine

As pessoas acham graça quando eu falo, mas é a verdade.

Não existe nada mais assustador do que PATRINE.

Não acredita?
A lista está de fato incongruente?
Então tente provar o contrário!

Situando o leitor, os vilões do seriado da Estrela Fascinante, a super-heroína criada por Shotaro Ishinomori (SIM, o criador dos Kamen Riders!), em grande parte, são inspirados em lendas japonesas, e este é também o caso deste apavorante personagem.

O Deus Enguia surge no episódio 17 do seriado, no qual Patrine se envolve em um estranhíssimo evento envolvendo uma família de carpas capazes de adquirir forma humana, constituída por um pai, uma mãe e o filho do casal, um garoto que não deve ter mais do que 10 anos de idade.

À princípio, Patrine precisou enfrentar a estranha família para salvar Kenji, um dos moleques integrantes do seu "fã clube", que fora por eles sequestrado e vestido como uma noiva japonesa (?).

Incapazes de fazer frente ao poder da heroína, os sequestradores decidem contar a sua triste história e pedir a ajuda.
Durante aquela época do ano, as carpas constantemente visitavam a terra para colocarem em prática as suas tradições de fazer piqueniques e apreciar a queda das pétalas das flores das cerejeiras.
É então que o Deus Enguia entra na história, outro peixe que pode assumir a aparência de um homem. Era ele que, com o seu poder de causar terremotos, proporcionava o belo espetáculo da natureza tão admirado pela família de carpas.
Tão fascinados eram com tal poder que prestavam honras e adorações ao dito Deus Enguia.

Por que o Deus Enguia é tão assustador?

Primeiro faça um paralelo de sua história com uma das lendas folclóricas brasileiras.

Sabem a lenda do Boto? O cetáceo amazônico safadinho que se transforma em um macho alfa, jovem e elegante em noites de Lua cheia, seduzindo as moças solteiras mais bonitas, engravidando-as e depois as abandonando?

O caso do Deus Enguia é parecido. 
Mas aqui é um peixe que se transforma em um cara elegante, embora velho, feio e com uma perversão que em nada deve ao nosso precioso tesouro da fauna brasileira.

O Deus Enguia exigiu da família carpas um tributo.
O seu tributo? 
Ele queria um noiva.
E quem seria a sua noiva?

O FILHO do casal carpa deverá se tornar a ESPOSA do Deus Enguia!!!

O Deus Enguia anuncia o seu desejo de desposar um garotinho com um sorriso cheio de dentes e uma expressão de causar asco em qualquer espectador.
E ele ameça a família. Caso não lhe entreguem a criança, causará um terremoto de grau 8 de magnitude capaz de destruir completamente o corpo de um homem, reduzindo-o a pele e ossos!

Daí o motivo para o sequestro do Kenji. 
A família carpa pretendia enganar o tarado entregando outra criança no lugar do seu filho.

O personagem e todo o seu encontro e luta contra Patrine são bem perturbadores.
Mas o episódio traz uma mensagem oculta interessante.

O filho carpa, obviamente, não queria se casar com aquele velho pedófilo.
O pai carpa ficou sem saber o que dizer, afinal era a sua tradição honrar as cerejeiras e ao Deus Enguia. "Existem coisas neste mundo que são inexplicáveis", ele declara e também pensa nas consequências de não cederem aos desejos do seu benfeitor.
Mas o pai carpa chega a uma conclusão: mais importante do que obedecer a tradição é proteger o seu filho. O dever dos pais acima de qualquer coisa é cuidar da integridade dos seus filhos ante qualquer situação, mesmo que isso signifique quebrar regras estritas.

E qual o tipo de pai que não zela por seu filho acima de tudo?

Após Patrine punir o Deus Enguia por, segundo ela, mesmo na sua idade não sentir vergonha de ter o desejo tão doentio como o de casar com uma criança, deixa também uma mensagem complementar.

Ao mesmo tempo que passa uma reafirmação ao conservadorismo japonês, parte da cultura deste povo, ataca o conservadorismo reacionário que tanto fere a juventude em nome de regras cruéis.

Quando uma cultura restringe as liberdades, esta tradição pode assumir um caráter maléfico.
Patrine declara que respeitar as tradições é importante, mas não mais do que garantir a proteção das crianças e dos jovens.
Precisou aparecer um homem enguia pedófilo a instrumentalizar da tradição de uma família em nome de si próprio para a mensagem ser entregue. 

Patrine é um cult no Japão e um motivo de piada por estas bandas.

Mas eu digo, nunca subestimem uma obra assinada por Shotaro Ishinomori!

Sério mesmo que encontrei um sub-texto em Patrine?


Bons pesadelos!

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